Registo de algumas análises, farpas e aforismos no Facebook de José Adelino Maltez

27
Set 09

Tal como previamente o escrevi, todos podem, agora, comentar as inúmeras vitórias eleitorais de Pirro. E Fernando Pessoa tinha razão quando observou que, em muitos casos, vencer equivale a ser vencido. Porque se todos ganharam, todos fomos vencidos, porque ainda não há um novo ciclo de clarificação. Democracia não é sondajocracia. A sondagem mostra a vontade de todos conjugada no pretérito. A democracia foi a vontade geral. Cada um decidiu como se fosse a própria república, abdicando do respectivo interesse. As sondagens foram fotografias do passado. O povo em voto foi projecção cinematográfica, a não sei quantas dimensões. E a intuição dos grandes políticos continua a ser hierarquicamente superior às análises. Eles podem e devem ter o lume da profecia, se tiverem saudades de futuro. Hoje já não céu nem inferno. Entrámos todos no limbo. Temos resultados tão de encruzilhada como os alemães, porque a Europa a que chegámos, como dizia Delors, são dois terços de remediados e aposentados que, de forma egoísta, assentam num terço de socialmente excluídos e no endividamento das gerações futuras.

 

publicado por José Adelino Maltez às 22:42

22
Set 09

De que forma é que os recentes desenvolvimentos deste caso – revelação do e-mail em que Fernando Lima teria agido alegadamente “a mando do Presidente” e afastamento agora do assessor a poucos dias das eleições – mancham a reputação política de Cavaco Silva?

Cavaco não é Deus nem Nixon. Os recortes do mais recente enredo apenas devem ser a ponta visível de um mais profundo “iceberg”. Aquilo que agora analisamos é apenas uma procissão que não saiu ainda para a praça pública, até porque deve repugnar a alguns actores politicos a mistura do público e do privado ... As confrarias apenas assomaram, em procissão, aos passos perdidos do Pátio dos Bichos...

 

Lembra-se de outras alturas no passado (enquanto líder do PSD, primeiro-ministro, candidato presidencial ou Presidente da República) em que a imagem de seriedade de Cavaco Silva tenha sido posta em causa desta maneira? Ou é uma situação nova, uma primeira queda?

Na campanha eleitoral de Fernando Nogueira, Cavaco desmentiu-o publicamente. Nogueira foi derrotado, abandonou a vida política e optou pela actividade bancária.

 

Já há analistas a falar num processo de ‘impeachment’ (impugnação de mandato). É exagerado ou uma possibilidade em aberto?

Cavaco, até agora, é de uma grande coerência. Um dos políticos mais experimentados que continua a insinuar discursos contra os políticos, mantendo aquela boa propaganda que é a de fazer propaganda, mas fingindo que não  faz propaganda.

Este episódio, em que ainda faltará pelo menos uma explicação pública do Presidente no pós-eleições, pode levar Cavaco Silva a não avançar para um segundo mandato em Belém?

Antes dos cenários das recandidaturas, importa saber que governos vamos ter nos próximos dois anos, porque as circunstâncias de crise não permitem que a história se repita. Seria tragédia, antes de ser uma comédia.

Caso resolva candidatar-se às próximas Presidenciais – onde eventualmente poderá enfrentar um candidato consensual à Esquerda – a reeleição de Cavaco Silva fica mais difícil após este caso?

Julgo que as anteriores clivagens de esquerda e de direita irão ser alteradas dramaticamente, a partir do próximo dia 27 de Setembro. Se, em termos eleitorais, se reproduzirem as divisões sociais eurocêntricas de dois terços de uma classe média de remediados (a do Bloco Central) e um terço de excluídos (correspondentes ao BE, PCP e CDS), conforme o dito de Jacques Delors, o equilíbrio do situacionismo entrará em “out of control” e teremos um ciclo de criatividade, com a verdadeira imaginação no poder. 

Relativamente ao período eleitoral, o Presidente era apontado até há pouco tempo como um possível garante da estabilidade política, face à fragmentação que as sondagens apontam. Na sequência deste episódio, de que modo é que essa tarefa pode ficar dificultada?

O Presidente não é Deus. Pode pecar e arrepender-se, cair e levantar-se. E precisamos de um bom guardião da Constituição.

Caso se concretizem as estimativas das sondagens – e no cenário do PS ser o partido mais votado mas rejeitar uma coligação com o Bloco; PSD e CDS/PP se entendam e juntos tenham uma percentagem superior aos socialistas – o que fará o Presidente? Essa opção poderá ser agora diferente do que seria antes deste episódio?

Pode não haver coligação entre PS e os partidos não-PSD do hemiciclo. Basta um governo minoritário PS, mesmo que seja sem Sócrates, com dois acordos de entendimento parlamentar com o BE e o PCP em certas questõese muitas cláusulas de salvaguarda. Basta recordar que mesmo o democrata-cristão Andreotti teve um governo apoiado parlamentarmente pelo PCI em plena guerra fria, embora o imediato assassinato de Aldo Moro tenha executado o plano de fundo da “operation chaos”. Aliás, o PSD e o CDS, como secções nacionais da multinacional PPE, estão sem autonomia e teriam de apoiar o PS contra o BE e o PCP em matérias europeias e de segurança global.

O que esperar da relação entre Cavaco Silva e José Sócrates, caso este seja convidado a formar governo? Novamente cooperação institucional no discurso oficial e conflitualidade latente na prática e nas entrelinhas?

Não tarda que voltem ao estado de graça de cooperação estratégica que foi o normal anormal deste ciclo presidencial cavaquista. É mais aquilo que os une do que aquilo que os divide. Temo que o PSD continue a ser espaço de sementeira de eucaliptos providenciais.

publicado por José Adelino Maltez às 23:02

21
Set 09

Cavaco Silva não é Deus nem Nixon. Pode errar e deve levantar-se, para poder continuar a ser o guardião da Constituição. E no palácio da república em figura humana, vale a pena termos bons exemplos. Mas a procissão ainda não saiu do Pátio dos Bichos. A liberdade de imprensa é, de facto, um bem superior ao respeitinho. E a liberdade de expressão de pensamento, uma necessidade, para podermos denunciar publicamente os erros dos chefes do estadão. As minas e armadilhas fragmentaram-se todas, em sucessivas desfragmentações e importa ter cuidado com as campanhas negras: as vidraças são de todos e todas podem ser quebradas pelo efeito boomerang. Aguardemos o estádio superior de luta de uma campanha que já ultrapassou o nível do belo interregno d’os Gatos, aliás bem menos fedorentos que certas teorias da conspiração e que muitos espiões em autogestão, esses ocultistas que contribuíram para esta remacaízação serôdia da democracia. Porque importa seguir o conselho presidencial, sobre não sermos ingénuos, sobretudo, neste tempo de homens tão lúcidos, onde é imperioso termos a lucidez de continuarmos ingénuos. Julgo que deve terminar o ciclo dos familiares, moscas e bufos que querem manter o emprego de caça-fascistas, caça-comunas, caça-pedreiros e caça-jesuítas, esses resíduos sólidos de extrema-esquerda e extrema-direita que nos continuam a poluir!

 

 

publicado por José Adelino Maltez às 23:18

16
Set 09

Manela, desta, esmagou Sócrates. Teve sentido de humor, mostrou-se capaz de vencer o cabo das Tormentas e a democracia ganhou em esperança competitiva. Nem o ódio bolorento de alguns maneleiros me impedem de ser justo. Parece que a líder do PSD começa a aprender com os erros cometidos.

publicado por José Adelino Maltez às 00:43

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Biografia
Bem mais de meio século de vida; quarenta e dois anos de universidade pública portuguesa; outros tantos de escrita pública no combate de ideias; professor há mais de trinta e cinco e tal; expulso da universidade como estudante; processado como catedrático pelo exercício da palavra em jornais e blogues. Ainda espera que neste reino por cumprir se restaure a república
Invocação
Como dizia mestre Herculano, ao definir o essencial de um liberal: "Há uma cousa em que supponho que ate os meus mais entranhaveis inimigos me fazem justiça; e é que não costumo calar nem attenuar as proprias opiniões onde e quando, por dever moral ou juridico, tenho de manifestá-las"......
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