Desde 1717 que qualquer sociedade liberal ou democrática sabe, como alguns proclamados liberais e democratas parecem desconhecer, que uma sociedade secreta iniciática não pode ser uma sociedade secreta política. Até na Noruega, onde os 20 000 maçons são publicamente escrutináveis. Sempre que se confundem os planos, de um lado e de outro, há um risco de regresso à intolerância, ao fanatismo e à ignorância.
Quando o jovem Afonso Costa, na sua dissertação académica de 1895, A Egreja e a Questão Social, assumia o hibridismo da colectivização social, mas sem estatização da economia, ele estava a profetizar um modelo que se tornou dominante entre nós, do salazarismo ao presente “ismo” do social e das respectivas armadilhas. Porque todos os que podem, livremente, fazer, da política um distanciado objecto de análise, conseguem notar que, na prática, as teorias dos programas eleitorais e das ideologias invocadas são sempre outras. Basta recordar, seguindo Vitorino Magalhães Godinho, que, em 1832, os rendimentos das ordens religiosas andavam pelos 1 162 contos, enquanto o Estado recolhia apenas 1 600 contos em impostos directoos. Isto é, as políticas públicas eram exercidas fundamentalmente pelas pelo clero e a nobreza, do ensino à saúde, incluindo a segurança e a defesa. Por outras palavras, por cá, tanto foram os liberais que implantaram o Estado como, depois, vai ser Salazar a instituir o que, meio século antes, fora semeado por Bismarck. Tal como, depois, vão ser os socialistas de Soares a pôr o socialismo nacionalizador na gaveta e a iniciar a era das privatizações e de acordos neofeudais com as forças vivas de uma economia privada que nos condicionou sem mercado. Infelizmente, a peneira das ideologias não consegue tapar-nos o sol de um dos nossos falhanços estruturais: a existência de uma classe média geradora de receitas fiscais, porque ela é cerca de um quarto dos que estão abaixo do limiar da pobreza e paga mais de metade dos impostos. Daí o perigo da insustentabilidade do sistema, onde quase um milhão de eleitores bailarinos costumam passar do PS para o PSD, e vice-versa, os tais “self made men” que ainda confiam que o aparelho de poder vai tratar desigualmente o desigual, premiando o mérito e combatendo o principal inimigo do Estado e do social: a desigualdade da herança, da cunha e da compra do poder.