Para os devidos efeitos, confesso que, por não poder ter partido, estou condenado a ser comentador político e que não divido o mundo entre os que são adeptos de Mendes Bota e os que foram à Festa do Avante, porque tanto não tenho tolerância zero face ao presente governamentalismo, como também não divido o mundo entre amigos e inimigos.
Prefiro continuar a discutir os novos deuses, as velhas pátrias, as antigas constituições e os eternos impostos contra a família e os indivíduos. Se reconheço como excelentes os economistas que nos presidencializam, primo-ministerializam e ministerializam, tenho dúvidas e até me costumo enganar. Daí que não goste de ser enrolado pelos que fingem que há previsões e cenários sobre o princípio do fim, quando ainda estamos no mero fim do princípio e continua a faltar que, nos princípios, estejam os verdadeiros fins!
Problemas económicos e financeiros como os desta encruzilhada só se resolvem com medidas económicas e financeiras. Mas não apenas com as medidas económicas e financeiras de um memorando negociado por Sócrates, face à coacção das circunstâncias e a reserva mental dos que assinaram o texto. Tenho a ilusão de acreditar que, a partir de segunda-feira, o novo líder do PS pós-socrático poderá ter várias reuniões com o chefe do governo sem exigir a presença de testemunhas, para que não se reduza o consenso dos tais 85%, que são qualitativamente melhores que o absolutismo curto da mera aritmética parlamentar.
Daí detestar que alguns activistas da teatrocracia exagerem nos argumentos de rábula, os tais que podem gastar-se pelo mau uso e transformar-se em caricatura, quando for inevitável uma adequada maioria constitucional. Já conheci muitos desses excelentes que, depois de desusados, passam a prostituir-se pelo abuso do espectáculo.
Como sempre fui céptico face aos programas que estão na base deste governo, continuo entusiasta face aos velhos princípios liberais, que estão à esquerda do PPE e à direita do socialismo europeu. Prefiro recordar que, para vencermos o Adamastor, sem morrermos na volta, é inevitável a geometria política e social de um acordo de regime, para que nenhum piloto do futuro tenha a amargura de poder ser o coveiro do regime.